quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Política & religião: o Estado deve ser laico, mas o indivíduo não é


por Luiz Ulisses Bender

Quando se vê um religioso envolvido com política (mais proeminentemente quando se trata de um pastor) é comum que se volte ao debate sobre a relação entre religião e política. Geralmente se afirma que não se deve misturar as duas coisas, que preceitos religiosos não devem influenciam na legislação ou na tomada de decisões por parte do Executivo. Que o Brasil é e deve continuar sendo um Estado laico, isto é, não vinculado a nenhum tipo de confissão religiosa.

Bem, eu acredito que todo Estado deva ser laico, não se envolvendo em questões de caráter religioso. Entretanto, algo que as pessoas costumam esquecer (ou não se dão conta) é que os indivíduos que compõem a nação não são e nem podem (uso "podem" no sentido de poder e também no de conseguir) ser laicos.

Ora, é bem sabido que as diferentes correntes religiosas, em sua essência, fornecem ao indivíduo uma espécie de filosofia de vida. A pessoa é, dessa forma, influenciada em seu modo de pensar pelas crenças da religião que confessa.

Mas o mesmo se dá com os não-religiosos, pois mesmo que não sustentem sua maneira de viver em um conjunto de preceitos religiosos, ainda assim defendem um grupo de coisas nas quais acredita ou sua própria filosofia, que sintetiza seus valores.

Assim, não importando qual fé o indivíduo professe (ou não professe qualquer fé), todo ser humano tem um conjunto de valores éticos e morais, uma forma de enxergar e interpretar o que vê. Um modo de encarar a vida, a si mesmo e o mundo à sua volta. Enfim, uma filosofia de vida, que é a síntese de suas crenças pessoais.

Invariavelmente, a maneira de pensar do sujeito será determinada por estes quesitos. Ele irá levar as influências destes aspectos para onde quer que for, não podendo se alienar deles. Pelo contrário até. Através deles definirá suas posições a respeito de todos os temas que tiver que tomar um partido, uma decisão. Em outras palavras, é este conjunto de valores e filosofias que determinará também seu posicionamento na política.

Podemos ver então, que o problema não é se o indivíduo é padre, pastor, pai-de-santo ou ateu. De qualquer forma, pleiteará por seu conjunto de valores, pelo que acredita no campo político. Alguns desses valores estarão fundamentados (ou serão respaldados) por uma crença religiosa, ao passo que outros serão diametralmente opostos a toda e qualquer preceito religioso, dependendo da maneira de pensar do cidadão.

Dessa forma, compreendo também que um Estado laico não é aquele que repele toda manifestação de cunho religioso do seu âmbito político. Nem aquele que se aliena da religiosidade do seu povo. Tampouco que coíbe expressões de fé de seus funcionários. E nem mesmo que preconceituosamente define todo representante de um setor confessional da sociedade como recalcado, fundamentalista e radical. Não.

Estado laico é aquele que não se intromete em questões religiosas. Que não privilegia esta confissão em detrimento daquela. Que em seu seio toda e qualquer agremiação religiosa pode se estabelecer e crescer, tendo liberdade de anunciar suas crenças. É um Estado que sabe respeitar tanto aqueles que afirmam não crer em Deus algum como aos que acreditam em algum tipo de Deus.

Afinal, o Brasil, como Estado laico, precisa compreender que mais de 90% de sua população professa algum tipo de religião. E ainda que boa parte deste percentual não siga totalmente os preceitos da fé na qual diz acreditar, a maior parte dos brasileiros ainda é, sem dúvida, influenciada por algum tipo de crença religiosa e, portanto, vão se utilizar dos subsídios por ela fornecidos no modo como pensam e interpretam a sociedade. Ou seja, na política.

Abraço a todos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário